Todas as vezes em que ela, uma senhorinha de idade já bastante avançada e sempre vestida como uma pin-up, aparecia na quitanda, fazia sempre o mesmo pedido totalmente sem sentido.
Chegava ali, diante das prateleiras onde estavam expostas à venda os legumes, as frutas e as verduras, e pedia sempre por cimento, tijolo e cascalho.
Com muita boa-vontade, o quitandeiro ouvia-a e então, muito generosamente, entregava-lhe uma sacola plástica cheia de algumas sobras do dia anterior, daquilo que ela pedia, ainda em boas condições para consumo.
Vê-se que, na verdade, o que ela pedia não tinha sentido em razão do contexto dentro do qual tal pedido era apresentado: uma quitanda.
Certo dia, logo pela manhã, quando o quitandeiro fazia subir a porta de ferro do estabelecimento, ela já estava do lado de fora, sentada na calçada da frente, esperando para poder entrar. Assim que ouviu a porta sendo erguida, pôs-se de pé. Em seguida, correu para diante do balcão e, mais uma vez, depois de cumprimentar o quitandeiro com um:
– Bom dia.
apressado, pediu-lhe:
– O senhor me vê cimento, tijolo e cascalho, por obséquio.
Diferentemente do que fizera nos outros vinte dias anteriores em que ela aparecera ali diante do balcão de sua quitanda com esse pedido, o quitandeiro, ao invés de entregar a ela uma sacola com algumas sobras dos produtos ali vendidos, deu-lhe uma sacola
(bastante mais pesada que as sacolas recebidas nos dias anteriores)
que trazia dentro um pequeno saco de 5 quilos de cimento, dois tijolos e uma porção de cascalho.
Ao receber a sacola em suas mãos, ela deu uma cambaleada: não esperava por aquele peso todo.
Depois que conseguiu equilibrar-se, ela abriu a sacola para ver o conteúdo que ia lá dentro. Quando voltou a erguer a cabeça, a mulher tinha no rosto um sorriso de lado a lado da bochecha. Ela então apertou a sacola contra o peito, piscou para o quitandeiro, daí virou-lhe as costas e saiu caminhando para fora da quitanda e nunca mais voltou.