Bastava fevereiro se aproximar para que seu estado de humor, em geral sujeito a poucas variações, apático mesmo, sofresse um abalo, baixando até quase o ponto de uma verdadeira melancolia. Tal ocorria porque, junto com fevereiro, tradicionalmente também chegava o Carnaval.
E, para Carolina, os Carnavais eram datas tristes como, para muitos, são os Natais e os aniversários da morte de entes queridos: ao longo dos anos, ela sofreu as maiores perdas de sua vida sempre nesse feriado: primeiro foram seus pais; dois anos depois, seu primeiro marido, e, anos mais tarde, foi-se o segundo.
Aos 73 anos, viúva por duas vezes, sem filhos, sozinha, ela passa os dias do Carnaval a olhar, do alto da diminuta janela de sua quitinete, os bloquinhos de foliões que desfilam lá na rua, alguns andares abaixo daquele de sua morada.
Gosta de dizer para si mesma, em pensamento, que no seu tempo de moça jovem, tudo era muito diferente e melhor.
De fato, naqueles idos anos, a lei de então não obrigava ninguém a ser feliz, como faz a lei atual, cuja vigilância, fazendo uso de táticas de uma blitz policial, cresce exponencialmente nessa época do ano. Não por outra razão, para muitos o Carnaval é uma época tão obrigatoriamente festiva e alegre: estão apenas a cumprir a lei.
Receosa de ver-se privada de sua liberdade, de ser presa em flagrante por desobediência a essa lei, Carolina prefere então passar esses dias a salvo na segurança das quatro paredes de sua quitinete, onde ao menos é livre para sentir-se triste.
Está feliz assim.