Já não estar

Naquele momento, em que tudo já tinha sido dito, parecia-lhes um ponto de não retorno, Sentados em lados opostos da mesa da sala de jantar, tentavam evitar o constrangimento do contato com o olhar do outro, desviando os olhos para o celular, para a paisagem da janela, para o teto, a parede, o chão, para dentro de cada um, A conversa que começara meio sem rumo, em pouco tempo encontrou um norte e para ele seguiu, a passos firmes, como se ali estivessem apenas para sacramentar algo que já vinha pelas suas mentes, Para dizer em palavras o que os gestos já acenavam, Abrir uma brecha de respiro numa situação que há muito vinha sendo sufocante para ambos, Para escrever mais um capítulo na narrativa da relação: o final, Não que a relação só terminasse ali, naquele momento, A bem da verdade, já havia terminado meses atrás, Ali, em volta da mesa, apenas deram voz aos sentimentos, sacramentaram, oficializaram, fizeram pedra o que antes era nuvem, A regra que faz a união não é a mesma que faz a separação, Para a primeira, é necessário um encontro de vontades, Para separar, basta que um a queira, Mesmo antes de verbalizada a decisão pelo fim, aquelas duas pessoas já não eram mais um casal, Há muito instalara-se a ausência do beijo, do carinho, mas também das brigas e discussões, Veio a paz? Vieram os silêncios, longos silêncios a preencherem o vazio da falta do que compartilhar, A pouca conversa, depois, mudou de assunto, de tom, de emoção, de cor, os olhares que a envolviam mudaram, Não se destrói uma ponte para deixar um vale em seu lugar? Ou se constrói outra ponte para unir pontos que então precisam de outra ligação? Vai ver é cada um para seu lado e pronto, vai ver que sim, vai ver que não, Como a poeira que vemos assentar sobre uma longa estrada de terra depois que a vida passa, o tempo dirá.